segunda-feira, 15 de agosto de 2016

A PREGAÇÃO APOSTÓLICA E PÓS-APOSTÓLICA

O Período Apostólico
Não raramente que aqueles que estudam História de Pregação apontam as cartas apostólicas no Novo Testamento como exemplos de homilética apostólica.  Enquanto estas epístolas, sem dúvida, dão a forma em que os apóstolos expunham os fundamentos da Fé Cristã, deve se ressaltar que  o contido nelas se trata de pregação e não de sermão. O estilo epistolar governa todos os documentos. Esta posição deve ser mantida, apesar da postura de  teólogos de índole liberal terem como duvidosos os destinatários indicados nas epístolas sugerindo que essas seriam pregação oral posta por escrito em gênero epistolar. Mas, como não há comprovação dessas hipóteses (como sucede com muitas das ideias liberais de um modo geral por mais verniz acadêmico que tenham), os estudiosos da pregação no Novo Testamento preferem se dedicar as pregações contidas no livro de Atos dos Apóstolos por serem o registro da proclamação oral, o mais próximo que temos de um sermão, no Novo Testamento. Porém, a que se considerar que as pregações registradas em Atos não correspondem literalmente as pregações orais dos Apóstolos, mas a redação que Lucas, autor de Atos, deu a elas. Todavia é de se notar que essas pregações tem claramente  o caráter de sermão, conforme indicado por escritos pós-apostólicos, e sermão do tipo missionário, feito de acordo com o público ao qual é dirigido. Se eventualmente não são uma transcrição literal dos discursos de Pedro e Paulo correspondem ao copidesque fiel da pregação deles conforme se sabe por outros textos neotestamentários e pela literatura patrística. É bom sempre lembrar que Lucas compôs seus escritos (o Evangelho e Atos) após acurada pesquisa com ministros da Palavra e testemunhas oculares (Lucas 1. 1-3; Atos 1.1ss).
Os Apóstolos pregando o Evangelho no traço clássico de Gustave Doré

Resumo da Pregação Apostólica
O conteúdo do que os apóstolos e primeiros cristãos pregavam pode ser traçado pelos escritos do Novo Testamento:

  • As promessas de Deus feitas no Antigo Testamento já foram cumpridas com a vinda de Jesus, o Messias (Atos 2.30; 3.19, 24, 10.43; 26.6, 7, 22; Romanos 1.2-4; 1 Timóteo 3.16; Hebreus 1. 1-2 ; 1 Pedro 1. 10-12; 2 Pedro 1. 18,19); 
  • Jesus foi ungido por Deus em seu batismo como Messias (Atos 10.38); Jesus começou o seu ministério na Galileia depois de seu batismo (Atos 10.37); 
  • Ele realizou um ministério libertador, fazendo o bem e realizando grandes obras pelo poder de Deus (Marcos 10.45; Atos 2.22; 10.38);
  • O Messias foi crucificado de acordo com o propósito de Deus (Marcos 10,45; João 3.16; Atos 2.23; 3. 13-15, 18; 4.11; 10.39; 26.23; Romanos 8.34 ; 1 Coríntios 1. 17-18; 15.3; Gálatas 1. 4; Hebreus 1.3; 1 Pedro 1.2, 19; 3.18; 1 Jo 4,10);
  •  Ele foi ressuscitado dentre os mortos e apareceu aos seus discípulos (Atos 2.24, 31,32; 3.15, 26; 10. 40,41; 17.31; 26.23; Ro 8.34; 10. 9; 1Coríntios 15. 4;7, 12; 1 Tessalonicenses 1.10; 1 Timóteo 3.16; 1 Pedro 1. 2, 21; 3.18, 21);
  •  Jesus foi exaltado por Deus e dado o nome de "Senhor" (Atos 2. 25;29, 33-36; 3.13; 10.36; Romanos 8.34; 10. 9; 1 Timóteo 3.16; Hebreus 1. 3 ; 1 Pedro 3.22);
  • Ele concedeu o Espírito Santo para formar a nova comunidade de Deus (Atos 1. 8; 2. 14;18, 33, 38-39; 10. 44-47; 1 Pedro 1.12);
  •  Ele voltará para o julgamento  e a restauração de todas as coisas (Atos 3. 20;21; 10.42; 17.31; 1Co 15. 20-28; 1 Tessalonicenses 1.10).;
  • Todos os que ouvirem a mensagem devem se arrepender e ser batizados (Atos 2.21, 38; 3.19; 10.43, 47;48; 17.30; 26.20; Romanos 1.17, 10. 9; 1Pedro 3. 21).
A forma em que essa proclamação (kerygma) é passada para os convertidos não é o sermão expositivo que hoje conhecemos, mas o enunciado fraterno (como sinaliza E. C. Dargan) feito principalmente nos lares, onde os primeiros cristãos se reuniam para ser discipulados e adorar ao Senhor (Atos 5.42).
O apóstolo Pedro pregando na casa de Cornélio

O Período Pós-Apostólico
Para o período pós-apostólico, o testemunho de Justino Mártir (100-165) é de especial valor (1 Apologia, 67), mostrando que no primitivo culto cristão ocorria a leitura das Escrituras e que após isso se seguia uma exortação de caráter prático com base no texto bíblico lido. Alguns anos mais tarde, Tertuliano (155-240) em sua Apologia (cap. 39)  testemunha semelhante prática e dá uma amostra da finalidade da pregação expositiva daqueles tempos: "Com as Palavras Sagradas nós nutrimos a nossa fé, animamos a nossa esperança, fazemos a nossa confiança mais firme, e por inculcações de preceitos de Deus confirmamos bons hábitos."  Na 2 Epístola de Clemente, texto apócrifo do século II, que provavelmente se trata de uma homilia transcrita, encontramos o seguinte testemunho: "Portanto, meus irmãos e irmãs, após a leitura das palavras do Deus da verdade, eu também li para vós uma exortação, a fim de que estejais atentos ao que foi escrito, para que ambos possam ser salvos, vós e aquele que prega no meio de vós...". O estudioso alemão A. Harnack (1851-1930) assinalou que na obra literária de Ireneu de Lião (130-202) há fragmentos de homilias cristãs envolvendo a polêmica com outros grupos ditos cristãos (gnósticos).
"O Bom Pastor" pintura cristã do século III

REFERÊNNCIAS:

https://www.ccel.org/s/schaff/encyc/encyc09/htm/iv.iv.xvi.htm
http://www.earlychristianwritings.com/text/2clement-hoole.html
https://en.wikipedia.org/wiki/Kerygma